Você já se deparou, zapeando pela internet ou museus, com obras de arte onde a paisagem parece borrada, as formas são meio incertas e as tintas escolhidas pra representar parecem ser um monte de borrãozinhos coloridos que, por um mero acaso, foram uma imagem? Se sim tem uma grande chance de ter conhecido uma pintura impressionista! O impressionismo foi um movimento que marcou a história da arte, principalmente na França, no final do século XIX, caminhando para o início do XX, e tinha como objetivo a quebra do ciclo de estilos que tinha acontecido até então… Nele os artistas, em sua maioria com foco em ambientes externos, retratavam o momento exato que estavam vivendo ou criando, explorando luz e sombra para dar sensação de “agora” e apostando em formas não definidas pra dar a quem aprecia impressão de movimento, como se tudo aquilo pudesse se desmanchar em um segundo.
O “grupinho” dos principais impressionistas era composto de Manet, Monet, Renoir, Degas, Gaugin, Cézanne e Pissaro… Fica parecendo que realmente só homens faziam parte, né? E, se você analisar os principais livros de história da arte são eles que serão mencionados. Mas pipocando por Paris e depois, consequentemente, por diversos lugares do mundo, as mulheres do impressionismo estavam ali, firmes e fortes, lutando contra esse imenso sexismo que fazia (e ainda faz) parte das artes, produzindo obras tão incríveis quanto as deles. E essas mulheres PRECISAM ser conhecidas.
Quando comecei a estudar (in)visibilidade feminina nas artes as impressionistas foram “caindo no meu colo” muito rápido, antes mesmo que essa pesquisa tomasse forma de verdade. Não sei se por coincidência ou se pelo fato de que esse SEMPRE foi meu movimento artístico favorito, desde que estudei pela primeira vez ainda no colégio, quando nem pensava que um dia estudaria para me tornar professora no assunto também. De repente minha pesquisa acadêmica tinha essas pintoras (e uma escultora) como foco. Ainda pesquiso, produzo conteúdo e amo conhecer todas as outras, mas quem vai pro Lattes, de verdade, são elas. Então hoje apresento a vocês a seleção mais difícil que já tive que fazer na vida com 10 mulheres do impressionismo que merecem ser conhecidas e apreciadas.
01) Mary Cassatt:
Provavelmente a principal entre as “damas do impressionismo”, Mary Cassatt era americana, mas viveu a maior parte da sua carreira artística na França, o berço do movimento. Sua família era de classe média alta e a mãe valorizava muito a educação de meninas, o que deu a ela acesso a viagens e estudo desde novinha, mas não impediu seu pai de ser contra sua carreira. Após muita frustração por não se encaixar na arte clássica e se recusar terminantemente a ter um patrono, ela foi convidada por Degas, de quem era amiga, a conhecer os impressionistas e aderiu ao movimento focando trabalhos em mulheres e crianças, tendo 11 obras na Grande Exibição Impressionista de 1879. Continuou pintando por muito tempo, mesmo diagnosticada com reumatismo, diabetes, neuralgia e catarata, essa última responsável pela cegueira que, enfim, a forçou se aposentar. Morreu aos 83 anos em Le Mesnil-Théribus, França.
Obras em destaque: Auto retrato (1880), Chá das Cinco (1880) e Jovem Mãe Costurando (1900). Aprenda mais sobre a Mary!
02) Berthe Morisot:
O nome feminino mais comumente citado em livros de história da arte sobre impressionismo, Berthe Morisot nasceu em uma comuna francesa onde era comum que meninas estudassem arte. Uma vez que sua família se mudou para Paris, começou a trabalhar como copista até assumir essa função no Museu do Louvre. Tornou-se amiga de Manet e casou com seu irmão, Eugene, com quem teve uma filha chamada Julie, amizade essa que resultou em troca de influências, sendo responsável por introduzi-lo no Impressionismo e ressentindo fortemente as críticas e falas sexistas do mesmo. No Salão de Paris de 1873, que teve grande representação do movimento, foi considerada a autora dos melhores trabalhos pelo Le Figaro. Sua família foi a principal temática retratada por ela nos quadros que pintou até morrer, aos 54 anos de pneumonia, enquanto cuidava de Julie que havia contraído essa doença.
Obras em destaque: A Irmã da Artista na Janela (1869), A Mãe e a Irmã da Artista (entre 1869 e 1870) e Milharal (cerca de 1975). Aprenda mais sobre a Berthe!
03) Marie Bracquemond:
Nascida de um casamento arranjado, Marie Quivoron teve aulas de pintura com o pintor e restaurador Vassort e aos 16 anos já tinha um quadro exposto no Salão de Paris. Trabalhou com Jean Auguste Ingres mas, frustrada com a simplicidades dos trabalhos que ele lhe passava, resolveu trabalhar com encomendas e chegou a ser copista do Louvre. Lá conheceu não só o movimento impressionista, do qual era parte e forte defensora, como também Félix Bracquemond, com quem se casou e teve um filho no ano seguinte. Trabalhavam juntos no ateliê onde ele era diretor, mas Félix não gostava de seu estilo, não aceitava suas sugestões e escondia seus trabalhos, fazendo com que ela abandonasse as obras autorais e passasse a trabalhar pontualmente com encomendas. Morreu aos 75 anos, em Paris, mas sua produção artística não é tão vasta quanto essa idade permitiria graças à falta de incentivo doméstica.
Obras em destaque: Mulher com uma Sombrinha (1880), Sob a Lâmpada (1877) e A Irmã e o Filho da Artista no Jardim em Sevres (1890). Aprenda mais sobre a Marie!
04) Eva Gonzalès:
Eva Gonzalès nasceu em Paris, França, filha de um escritor espanhol, o que permitiu que convivesse com artitas desde nova. Começou a pintar aos 16 anos enquanto aluna de Charles Chaplin e aos 19 já era pupila de Manet, sendo também uma das responsáveis por apresenta-lo ao movimento impressionista, e assim como o mestre não tinha muito o costume de expor suas obras. Casou-se aos 30 anos com o impressor Henri Guérard e 4 anos depois, ao dar a luz ao primeiro e único filho do casal, faleceu muito jovem, uma semana após seu mestre, o que não permitiu que tivesse muita notoriedade em sua época. Ainda assim produziu uma quantidade enorme de obras, entre pinturas e desenhos. Sua irmã, Jeanne Guérard-Gonzalès, também pintora impressionista (porém menos ativa no trabalho), se casou com Guérard após sua morte e os dois criaram, juntos, o filho do casal.
Obras em destaque: Retrato de Jeanne Gonzalès (antes de 1883), Despertar da Manhã (1876) e O Coque (entre 1865 e 1870). Aprenda mais sobre a Eva!
Você sabia? O impressionismo não pregava tantas regras em relação a materiais e temáticas, mas ainda assim a maioria dos pintores adeptos ao movimento costumavam pintar paisagens. As mulheres, por sua vez, nem sempre conseguiam seguir essa tendência por não ter acesso ao ar livre como eles tinham, por isso vemos ambientes domésticos e familiares como tema das obras da maioria delas: era um retrato da realidade em que estavam inseridas.
05) Louise Abbéma:
Louise Abbéma, uma francesa cuja família sempre conviveu com a comunidade artística local de sua cidade natal. Mudou-se para Paris ao começar a pintar aos 20 anos, onde teve aula com professores particulares. Retratava artistas da Comédie Française e foi retratista oficial da atriz Sarah Bernhardt, com quem manteve anos de relacionamento romântico e amizade, sendo sua principal modelo. Adepta ao ideal da “Nova Mulher” e do movimento feminista que crescia na Europa, renegava o papel tradicional da mulher na sociedade de sua época, se vestindo de forma andrógena e retratando assim as mulheres em seus quadros. Além de pintora era escritora, contribuiu com artigos para o Diário de Belas Artes. Morreu em 10 de julho de 1927, aos 73 anos em Paris, e pintou até o final de sua vida.
Obras em destaque: Jeanne Samary (1879), Manhã de Abril (1894) e Sarah Bernhardt (antes de 1927). Aprenda mais sobre a Louise!
06) Camille Claudel:
Um das histórias mais tristes da arte moderna, Camille Claudel era uma escultora francesa, estudante da Academia Colarossi. Foi aluna e amante de Rodin, a quem sua história é fortemente atrelada pelo relacionamento conturbado, acusações de roubo de obra e sabotagem por parte dela e que teve seu fim após um aborto espontâneo. Considerada a “Berthe Morisot da escultura”, produzia obras em tamanhos gigantes e materiais pesados, sendo chamada de “gênio” pelo compositor Debussy, com quem namorou. Após a morte do pai, sua família cortou seu patrocínio e ela não conseguia outros por ser mulher, foi diagnosticada com esquizofrenia, destruindo suas próprias obras ocasionalmente até, enfim, ser mandada para o hospício. Ficou lá por 30 anos, quase sem receber visitas, mesmo que os médicos tenham dado alta e a imprensa acusasse seu irmão, o poeta Paul Claudel, de ocultar um gênio. Produziu mesmo internada e ali morreu, aos 78 anos.
Obras em destaque: Perseu e a Górgona (1905), Mulher Agachada (entre 1884 e 85) e A Valsa (1883). Aprenda mais sobre a Camille!
07) Anna Ancher:
Parte de um grupo chamado “Pintores de Skagen” composto por escandinavos que se reuniam na pousada de seus pais para pintar, Anna Brøndum estudou arte em Copenhague antes de voltar para sua cidade natal e casar com o também artista Michael Ancker. Juntos os dois produziam e consumiam muita arte, de diversos tipos, mantendo viagens de campo e visita a exposições fora da Dinamarca mesmo depois do nascimento de sua única filha. Sua região era muito procurada por impressionistas por se tratar de belas paisagens naturais, tornando o local atrativo também para realistas e naturalistas, que produziam todos juntos. A pousada foi transformada em museu e assim ficou por 20 anos, entre 1908 e 28. Anna morreu aos 75 anos e Helga, sua filha, converteu a casa onde viviam no Museu Michael e Anna Ancker, que hoje é uma fundação de mesmo nome.
Obras em destaque: Retrato da Mãe da Artista (1913), Ceifeiros (1905) e Interior com a Filha da Pintora Helga Costurando (cerca de 1890). Aprenda mais sobre a Anna!
08) Nadežda Petrovic:
Heroína de guerra nascida na Sérvia, filha de professores e educada em uma escola só para mulheres, Nadežda Petrovic ganhou uma bolsa de estudos do Ministério da Educação sérvio para estudar arte em Munique. Retornou ao seu país em 1900 onde consumiu arte, estudou línguas e realizou sua primeira exposição solo, além de ajudar a organizar 1ª Exposição de Arte Iugoslava. Também deu aula em uma instituição de curso superior exclusivamente feminina. Nos anos seguintes fundou uma organização humanitária de mulheres para ajudar sérvios controlados pelo Império Otomano, perdeu ambos os pais, passou a produzir pinturas também com referências fauvistas e se tornou enfermeira nas Guerras dos Balcãs, onde recebeu medalha. Morreu de febre tifoide em Vajevo, aos 41 anos, e mais tarde seu rosto ilustrou a nota de 200 dinares sérvios.
Obras em destaque: Auto retrato de Nadežda Petrovic (1907), Hospital de Vajevo (1915) e Ksenija Atanasijevic (1912). Aprenda mais sobre a Nadežda!
09) Amy Katherine Browning:
A britânica Amy Katherine Browning (ou “Brownie”) entrou na Royal College of Arts aos 18 anos e, mesmo demorando um pouco para terminar o curso por problemas familiares, conseguiu destaque relativamente gratificante nesse período. Ao se formar conheceu Sylvia Pankhust, filha da grande líder do movimento sufragista feminista na Inglaterra. As duas então passaram a organizar exibições em prol da União Social e Política das Mulheres, movimento que lutava pelo voto feminino, enquanto ela ensinava artes ainda que continuasse produzindo (chegando a ganhar medalha de prata em um Salão de Paris) e ilustrava para o jornal de cunho feminista da amiga. Juntas criaram uma campanha para arrecadar dinheiro e conseguir emprego para mulheres vítimas da I Guerra Mundial. Após seu casamento com Thomas Dugdale e o fim da guerra voltou a produzir, retratando bastante as mulheres proletárias, além de paisagens e até mesmo nus femininos. Morreu aos 96 anos.
Obras em destaque: Na Janela, Trabalhadoras da Fábrica de Chapéu e Sombra da Limeira (1913) Aprenda mais sobre a Amy!
Leia também: As Sufragistas, resenha do filme baseado em fatos da luta pelo voto feminino na Inglaterra, de forma romantizada.
10) Georgina de Albuquerque:
Georgina de Albuquerque, brasileira nascida em Taubaté, aos 19 anos foi para o Rio estudar na Escola Nacional de Belas Artes. Lá conheceu seu marido, Lucílio de Albuquerque, com quem passou 5 anos na França estudando arte na Escola Nacional Superior de Belas Artes. Ainda em solo francês foi apresentada ao movimento impressionista e teve seus dois filhos. De volta ao Brasil, foi pioneira em vários aspectos como artista mulher. Sua obra prima, Sessão do Conselho de Estado, foi a primeira pintura histórica feita por mulher no país, colocando a Imperatriz Leopoldina como figura principal de um quadro sobre a independência do Brasil, ensinou na ENBA e, mais tarde, foi a primeira diretora de lá. Também deu aula de desenho na UFDF e transformou sua casa no bairro Laranjeiras no Museu Lucílio de Albuquerque. Muitas de suas obras estão expostas no Rio, principalmente no Museu Nacional de Belas Artes.
Obras em destaque: Roceiras (1930 – Museu Nacional de Belas Artes/RJ), Sessão do Conselho de Estado (1922 Museu Histórico Nacional/RJ) e No Cafezal (1926 – Pinacoteca/SP) Aprenda mais sobre a Georgina!
Quer conhecer mais sobre as mulheres do impressionismo?
Esse post faz parte do projeto Vênus em Arte, um canal no Youtube que visa a visibilidade feminina na história da arte! A série sobre as mulheres do Impressionismo foi a primeira e mais importante do canal, tendo “terminado” em maio mas também sem fim, já que continuará sendo alimentada sempre que possível. Para conhecer mais sobre o movimento e várias outras artistas que fizeram parte dele, inclusive de outros países e continentes, vocês podem acessar a playlist sobre o assunto por lá!
denise
Oie adorei conhece-las, eu nunca tinha ouvido fala delas, é gostei bastante
Paty
Amo demais seus videos e posts <3 super importante termos conhecimento das mulheres que nos cercam
Laura Nolasco
Ei Luly!
Amei o post! Eu sou bem perdida nesse rolê de história da arte, então não sabia sobre o tema, mas com certeza já tinha ouvido os nomes masculinos que você citou e nenhum dos femininos.
Adorei conhecer um pouco mais dessas mulheres. A que mais me chamou atenção visualmente foi a Amy Katherine Browning, e que história incrível a dela!
Beijos
Priscila
Ameeeei! Adoro ver mulheres da história e que fizeram história! Adoro descobrir coisas assim e ter novas ídolas!
Mariana
Olá! Que legal conhecer um pouco da histórias dessas dez mulheres e suas obras. Eu não as conhecia. Muito interessante!
Vitória Bruscato
Oi, Luly! Eu amooo esses posts! <3
Realmente, quando eu estudei História da Arte no meu curso, no impressionismo se falava mais sobre homens, aliás tem um quadro do Monet que eu amo que se chama "O Passeio".
Adorei conhecer essas mulheres que fizeram parte do movimento, parabéns pelo post!
Rebeca Stiago
Luly, eu quero te PARABENIZAR demais pelo conteúdo que você cria!!! Guria os teus posts são muito ricos de informação e eu sempre aprendo coisas que nunca pensei que ia ler, sabe? Eu achei que a “fase” impressionista eu tinha deixado na escola HAHA Mas aprendi mais aqui no teu post e gosto da tua pegada de valorizar as mulheres e o que “a história não conta”. Os teus posts são super ricos!!! Parabéns de vdd!! <3
Luma Vieira
Gostei muito de conhecer estas artistas por aqui, não conhecia muito sobre elas ou trabalho. Parabéns pela pesquisa e por colocar estes assunto por aqui. Gostei muito da arte de Eva Gonzalès. Beijos
Erika Monteiro
Oi Luly, tudo bem? Que trabalho incrível de pesquisa. Desde sempre valorizo o acesso e conhecimento da arte seja pelo período histórico ou passatempo como algumas pessoas preferem. Tinha uns 14 anos se não me engano quando comecei gostar de teatro, museu, exposições e da literatura em geral. Acredito que o impressionismo assim como outros movimentos refletem muito sobre seus artistas. Nunca tinha parado para pensar que algumas pinturas são sobre frutas, cômodos da casa, justamente porque as mulheres daquela época não tinham liberdade, ou não podiam ir ao ar livre. Me lembrou uma exposição espanhola que vi. Parabéns pelo trabalho incrível! Um abraço, Érika =^.^=
Malu Silva
Lembro que na época da escola, quando estudava artes, eu amava estudar sobre o Impressionismo! Porém quase nunca estudava obras de mulheres. Já vou pesquisar mais sobre o trabalho delas, adorei esse conteúdo!