Em 1958, Art Kane tirou uma foto que ficou conhecida como “Um Grande Dia no Harlem”, onde 57 músicos da Era de Ouro do jazz posaram em uma escada, sendo lembrados com muito estilo como ícones época em que viveram e entrando de vez para a história. Esse fato por si só me arrepia por completo, sendo uma completa apaixonada pelo Renascimento do Harlem, que três décadas antes levou a arte e a intelectualidade afro-estadunidense para o lugar de destaque onde sempre deveria estar em Nova York, se espalhando em seguida para o resto do país e resultando na conquista dos Direitos Civis dos negros por lá anos depois, mas hoje entrou na minha vida de maneira ainda mais especial, quando escritoras brasileiras de diversas cidades, até mesmo pelo mundo, se reuniram para reproduzir essa obra de arte, criando assim Um Grande Dia Para Escritoras – eu entre elas!
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A ação começou em São Paulo e logo foi se espalhando pelo Brasil, durante toda a semana passada vi anúncios de lugares aqui e ali e cliquei em cada um deles na esperança de ver alguma indicação de que Belo Horizonte tinha entrado na onda também. O mais maravilhoso, porém, foi que outras pessoas foram responsáveis pela informação chegar até mim, me marcando e enviando a publicação oficial que indicava a escadaria frontal do Centro Cultural Banco do Brasil, localizado na minha querida Praça da Liberdade, como local do evento. Sabe quando você cai na real que os outros te vêem como você sempre quis ser vista? Pois é, ali estavam amigos, colegas, conhecidos, pessoas com diferentes níveis de intimidade me vendo como escritora. Imediatamente marquei algumas amigas, compartilhei o post para que outras vissem e me preparei para estar lá no domingo de manhã.
Mas a vida é uma caixinha de surpresas, e infelizmente as que vieram dessa vez não foram as melhores.
No sábado de manhã, enquanto a gente se preparava para a abertura de uma exposição na Galeria onde trabalho, recebi a triste notícia de que uma familiar queridíssima da minha amiga-irmã tinha falecido. Quando os horários para velório e enterro chegaram até mim, percebi que coincidia muito e eu não poderia participar dessa foto histórica, pois corria o risco de não estar lá para dar apoio a pessoas que são minha família. Chorei MUITO, pela perda de alguém e pela perda do momento, até que minha melhor amiga, inconformada em saber que eu não estaria presente em algo tão forte, conversou comigo e se dispôs e me levar tanto no CCBB quanto no cemitério, nos trazendo em casa depois, garantindo minha presença nos dois locais. Chorei mais, me perguntando se eu era um monstro por cogitar aquilo, por priorizar uma foto à vida de alguém.
Porém, no fundo, não era isso que eu estava fazendo. Conversei com essa amiga, com minha irmã (a de “sangue”), comigo mesma e entendi que, em algum momento, eu veria essa foto pipocando para todos os lados, que veria os sorrisos das escritoras de Beagá e outras cidades de Minas Gerais estampados nela, com muito orgulho da profissão que têm – com razão –, e que me doeria MUITO não estar ali. Se eu podia estar nos dois lugares, ainda que não tanto quanto gostaria, e se tinha gente disposta a fazer isso acontecer por mim, era algo que não devia deixar passar. Então fui, levei meu primeiro livro comigo e posei, um pontinho cor-de-rosa bem na frente, sentada na beira da calçada olhando para meu lugar favorito no mundo, de costas para um centro cultural que adoro, cercada de outras de mim pra todos os lados.
Nossa vida é guiada pelo amor por criar e contar histórias, e no dia 12 de junho fizemos História de outra forma. Foi, realmente, um grande dia para escritoras, um grande dia por aí, um grande dia (mesmo que em muitos momentos doído) pra mim, um dia do qual vamos lembrar pra sempre. Obrigada Cris Rodrigues pela organização dedicada, CCBB BH e Academia Mineira de Letras pelo apoio e aos fotógrafos voluntários que se dispuseram a entrar nessa com a gente. Obrigada a todas as mulheres que escrevem, as daqui e as de lá, que fizeram questão de marcar presença, onde quer que seja. Obrigada a quem estava comigo nesse momento de maneira pessoal, sentindo que eu estar naquela foto era importante como eu sentia. E que cada vez mais mulheres, TODAS, possam ser e saber que são escritoras, com finalmente sou e sei disso também.
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Vitória Bruscato
A foto ficou incrível!
É muito incrível mesmo ver tantas pessoas te falando sobre o evento e te reconhecendo como a escritora maravilhosa que você é. 🙂
Sinto muito pela sua perda, e fico feliz que tenha sido possível conciliar os eventos. Arrasou demais!
Adriel
ai, meldels. olhei pra foto e quando vi um negócio rosa já detectei q era vc. huahauahuahaua.
amg, apesar do dia ter sido agridoce, uma divisão de sentimentos, é muito bacana te ver sendo reconhecida pela sua arte. logo vc q fala tanto sobre outros artistas.
sobre a foto, ela ficou maravilhosa. dei um google aqui pra ver a foto que foi inspiração e, cara, me arrepiei todo. olha como a cultura ultrapassa séculos e alcança tanta gnt. nem éramos nascido no primeiro ato e mesmo assim a informação chegou até nós.
brilha, Lulynha!!!
bj!