“Não sei, só sei que foi assim!” A fala de Chicó em “O Auto da Compadecida” define há 10 meses o que senti sendo co-curadora da exposição coletiva maa, que abriu em 17 de março de 2023 e ficou pouco mais de um mês na recém renomada Mitre Galeria – onde completo em breve dois anos de trabalho. Antes nominada de Galeria Periscópio, essa transi-transformação já era uma realidade pr’a gente, que estava ali dentro, há algum tempo, mas foi oficializada publicamente com a coletiva que contava com 26 artistas, metade deles representados e a outra metade convidados. Unindo ideias do diretor da galeria, Rodrigo Mitre, e algumas que zapeavam na minha cabeça e do outro curador da exposição, o artista Marcel Diogo, ela acabou se tornando perfeita, em alguns momentos propositalmente, em outros, confesso, de maneira quase cármica, sem planejamento, porque era assim que tinha que ser.
“A tradição ensina, com efeito, que há primeiro maa: pessoa receptáculo, e maaya: diversos aspectos de maa contidos na maa receptáculo. A expressão de língua bambara ‘maa ka maaya ka ca a yere kono’ significa: ‘As pessoas da pessoa são múltiplas na pessoa’.” – Amadou Hampaté Bâ
Assim sendo, aproveitando ensinamentos do Mestre Amadou, trazido por Marcel, e algumas palavras de Clarice Lispector, trazida por mim, a exposição celebrou a pessoa Mitre Galeria e as pessoas dessa pessoa; não só literalmente na forma de artistas, visitantes, funcionários e colaboradores, como também publicações, participações em feiras e, é claro, das obras que compõe o acervo. Trouxe o pensamento de que somos a maaya dessa maa, tão múltiplas quanto a própria, logo após completar 7 anos de funcionamento, seu primeiro setênio, buscando algo que ainda não tem nome, que vai além da liberdade e soa como ela. Brincamos com os sentidos, não só por meio de trabalhos que exploravam outros além da visão, mas também buscando “encher os olhos” e “dar água na boca” através de um programa potente e diverso que tem TUDO A VER com o que acreditamos (e seguiremos acreditando) em nosso trabalho!
Idealização e montagem:
Uma coisa sobre fazer uma exposição com participação de quase 30 artistas diferentes é que dá bastante trabalho reunir e curar o material desse pessoal todo! Claro que para os representados foi bem mais simples, fizemos uma pré-seleção de obras de cada um dos que a gente queria que participasse, depois a seleção oficial do que entraria para, enfim, informa-los que estariam incluídos nesse projeto. Pra quem era de fora, porém, deu um pouquinho mais de trabalho… Tivemos que entrar em contato com os próprios, suas respectivas galerias ou colecionadores que os tinham em coleções, redigir os contratos de consignação ou empréstimo e, claro, realizar o transporte de tudo pro nosso espaço. Felizmente a curadoria era feita por uma funcionária e um artista representado, então estivemos diretamente envolvidos nesses processos e muito presentes em todos eles, foi um privilégio danado pra mim viver isso!
A montagem também foi feita em etapas porque, novamente, eram MUITAS obras participantes, tivemos até que reduzir um pouco as de artistas que tinham várias possibilidades. Na hora de colocar tudo na prática, mais uma vez contamos com uma diversidade boa de pessoas trabalhando ali. Além de uma equipe contratada havia a equipe interna e até a presença de alguns artistas convidados! Não lembro exatamente quando ficou tudo 100% pronto, sendo sincera, só sei que o processo completo, entre alugar o primeiro andaime e a noite de abertura, levou mais de duas semanas. Até hoje não tenho palavras para agradecer todo mundo que embarcou nessa com a gente e topou fazer parte desse marco na história da Galeria e, claro, na minha também, tenho até medo de citar e esquecer alguém, mas essas pessoas sabem quem são!
Veja pedacinhos dessa exposição também no vídeo publicado no Instagram Reels!
I. Montagem da instalação de Massuelen Cristina, realizada pela própria; II. Elevação das embarcações de davi de jesus do nascimento que compuseram a vitrine; III. Instalação de obras bidimensionais nas paredes.
A abertura:
Depois dessa trabalheira toda, chegou o grande dia, a abertura de maa! Acho que nunca fiquei tão nervosa com a abertura de uma exposição na minha vida, logo antes do horário marcado estava no escritório realizando os preparativos finais, dobrando textos curatoriais impressos, tremendo de emoção! Normalmente esse tipo de evento por lá conta com buffet, mas nessa a gente queria muito que o foco fosse a exposição em si, tivemos “apenas” muita bebida, o que foi necessário porque estava muito, muito, muito calor mesmo. Claro que o objetivo de tudo isso era divulgar a nova marca da Galeria, só que ninguém imaginou que daria tão certo assim, sabe? Pensa só, 26 artistas, 2 curadores, 3 sócios, toda uma equipe e os amigos/familiares dessa galera toda, todo mundo divulgando convite e tentando se fazer presente, juro, foi loucura total, encheu demais, pra nossa alegria!
Além disso tudo, a comemoração foi na véspera de um evento importante no Inhotim, então tivemos a sorte que contar com pessoas queridas que não são de Belo Horizonte e estiveram ali antes, durante e depois dessa noite memorável. ‘Tava todo mundo bonito demais, eu consegui tirar um tempo antes para meu momento maquiagem e usei um vestido que amo, aqueles detalhes que fazem super diferença no nosso processo de estar bem num dia que foi feito para isso. Pra completar, e deixar tudo ainda mais especial, tivemos a participação do Lucas Telles no violão e do Daniel Guedes na percussão utilizando caixa de fósforo e prato, nos presenteando com um samba delicioso pra ninguém botar defeito e colocar geral nesse clima de explorar sentidos dentro do nosso espaço. Sim, essa foi a hora em que eu chorei!
Leia também: Exposição madeira doce, água áspera, de davi de jesus do nascimento, um dos artistas dessa coletiva.
I. Uma Lulynha MUITO FELIZ ao lado da fachada da exposição e, consequentemente, do meu nominho como curadora (e o lookinho BELO que escolhi para o dia); II. Vista de cima do salão expositivo; III. Vista da entrada da salinha expositiva; IV. Momento em que rolou uma apresentação de samba dentro da galeria.
Mulheres de maa:
Por fim, mas nunca menos importante, não posso deixar de falar desse meu lugar de estudiosa de mulheres artistas e como conseguimos uma equidade de gênero quase ideal. Foram 11 vozes femininas participantes, quase metade, um número que acho incrível tendo em vista algo que reparo e contabilizo bastante quando vou a exposições do tipo… Mais do que isso, tivemos diversidades entre elas, sabe? Idade, identidade, etnia, origem geográfica, narrativas: as mulheres de maa me enchem de orgulho e eu não poderia ser mais feliz sabendo que um dia curei uma coletiva que teve a presença delas, algumas das quais já era fã antes, e todas que seguem eternamente minhas ídolas queridas depois disso!
I. Dyana Santos (a obra que foi capa do material de divulgação da abertura); II. Gisele Camargo; III. Yanaki Herrera; IV. Jess Vieira.
Reportagem no Programa Agenda, da Rede Minas
(Aqui vou deixar vocês assistirem o vídeo para sentir o clima da coisa, mas preciso adicionar a observação egocêntrica de que morro de orgulho desse “Todo mundo pertence à arte!” final, acredito nisso com todas as minhas força e fico feliz em ter espaço para passar a mensagem que mais me importa.)
Sobre a curadoria e lista de artistas:
Luly Lage, que no caso sou eu mesma (hahaha), é assistente de vendas e galeria da Mitre, com formação em conservação-restauração de bens culturais móveis na EBA/UFMG e ensino de arte, idealizadora do projeto Vênus em Arte, blogueira e escritora (Instagram aqui!). Marcel Diogo é artista visual e professor, graduado, licenciado e mestre pela EBA/UFMG, representado pelas galerias Mitre e Diáspora, que trabalha com pintura em diversos suportes, performance, vídeos e objetos variados (Instagram e site aqui!). Conheça também os artistas que compuseram essa coletiva, Alice Ricci, davi de jesus do nascimento, Domingos Nunes, Dyana Santos, Éder Oliveira, Froiid, Gisele Camargo, Guilherme Santos da Silva, Hariel Revignet, Isa do Rosário Jess Vieira, Joacélio Batista, Manfredo de Souzanetto, Marcone Moreira, Marcos Siqueira, Maria Lira Marques, Massuelen Cristina, Paulo Nazareth, Priscila Rezende, Randolpho Lamonier, Sebastião Januário, Sidney Amaral, Tadáskia, Wallace Pato, Yanaki Herrera.
Valéria
Eu estou em choque que você trabalha numa galeria de arte, amei amei!!
Que incrível deve ser trabalhar num lugar assim. Claro, deve dar muito trabalho, como você falou mais no post, mas ver tudo pronto deve dar muitaaaa satisfação também.
Compartilhe mais por aqui como é sua rotina, achei muitoo interessante! 🙂
https://www.heyimwiththeband.com.br/
Aline
Luly, mulher!!! Que trabalho incrível! Todo mundo pertence á arte e a gente não pode esquecer isso e nem se distanciar da arte porque a arte nos conecta com nós e com os outros, com o mundo.
Adorei as fotos da exposição e fico muito feliz que tudo correu bem e que você se orgulha do trabalho realizado. Parabéns pelo seu trabalho, não apenas na curadoria, mas também no estudo de mulheres na arte!
Um beijo
adriel
amiga, como é bom ler esse post agora depois de ter visto PESSOALMENTE esse espaço tão lindo e incrível!
talvez vc nao saiba, mas visitar a Mitre foi a minha primeira visita em uma galeria na vida. tu sabe, sou da roça. mas essa foi a primeira de muitas, pq eu amei o ambiente, a energia e quero demais visitar outros espaços.
fico muito feliz por te ver fazendo, literalmente, seu nome, crescendo e se aventurando numa área que vc ama tanto.
te desejo muito sucesso, muitos jobs e mais exposições com sua curadoria.
bj!
Fernanda Rodrigues
Eu estou doida pra voltar a BH pra ir no seu trabalho! Sério, que lindeza e que potência te ver sendo cocuradora de uma arte tão bonita <3
Eu morro de orgulho!
Um beijo,
Fê
Vitória Bruscato
Que demais a exposição e que orgulho ver seu trabalho na prática, e o reconhecimento dele! Imagino a emoção que você deve ter sentido ao ver tudo pronto, e concordo: todo mundo pertence à arte!