Quando eu tinha quatro anos minha mãe recebeu meu boletim da escolinha e lá vinha “Prova Oral de Leitura” com a nota “B”, e uma notinha explicando que eu tinha tirado “B” porque estava gripada no dia e por isso não tinha me saído tão bem. Mas não foi a nota “baixa” que impressionou e sim o fato de que a filhinha dela estava lendo e ninguém na família parecia saber disso! A verdade é que eu sabia sim ler e já estava pronta para aquele próximo passo: aprender a escrever! Eu imagino que não tenha demorado muito, rapidinho eu já devia estar escrevendo tudo o que a professora mandava.
É engraçado isso de dizer que a criança “sabe escrever” quando ela está somente ali, repetindo textos que estão sendo ditados. Não sei dizer quando foi que eu REALMENTE aprendi pra valer, quando foi que eu aprendi a escrever aquilo que eu mesma criava, só sei que, antes que eu percebesse, escrever era algo que eu fazia em tempo integral. Nas redações da escola, nos exercícios de Para Casa, no meu diário onde eu contava (e ainda conto) o que fiz no dia-a-dia e até nos desenhos que eu fazia e sempre escrevia alguma coisa: meu nome, o nome de quem eu estava desenhando ou a explicação do que era algum elemento mal representado na cena retratada. Aos poucos deixou de ser uma atividade mecânica e passou a ser livre, passou a ser diferente, passou a ser MEU. E fui descobrindo que escrever era, provavelmente, o que eu fazia de melhor. Logo tive duas provas concretas disso quando ainda era criança e não entendia como funcionava esse progresso na nossa vida, ambas no ano de 2000, quando eu estava na 4ª série (hoje 5º ano) e o Brasil completou 500 anos desde sua descoberta.
A primeira delas foi logo na primeira prova de português que fiz naquele ano e eu não presenciei essa história, mas fui ter conhecimento dela alguns meses depois. A professora de português dividia as provas que tinha que corrigir em duas pilhas: aquelas que eram caprichadas e pareciam merecer uma nota promissora; e aquelas cheias de garranchos que provavelmente não teriam um bom resultado. Logo de cara a minha prova foi pra segunda pilha, não por ser desarrumada, bagunçada ou suja, mas pela minha letra que era HORROROSA. Sério, sempre foi e ainda é bem feinha, por mais que hoje em dia dê pra entender. A explicação é simples: eu era muito lenta na escola pra copiar coisas do quadro e afins, e para tentar acompanhar passei a deixar o capricho de lado e investi na agilidade. Até que funcionou, mas ocasionou nisso. Minha professora disse que colocou minha prova de lado sem nem pensar duas vezes, mas quando foi corrigi-la (por último!) levou um susto muito prazeroso: ela disse que era uma das melhores que tinha corrigido naquela turma e que eu escrevia muito bem. A partir daí minhas provas foram parar na primeira pilha, não importava a feiura da minha letra. Na época isso não significou muita coisa pra mim, a única parte dessa história que eu digeri foi que minha letra era feia o suficiente para merecer um desprezo inicial. A parte do elogio só foi ser processada na minha cabeça meses depois.
E aí foram chegando os preparativos para a comemoração de meio milênio do nosso país! Nesse ponto todas as escolas de Timóteo foram convidadas a enviar um aluno para participar de um concurso de redação e o melhor em cada categoria (por faixa etária) ganharia um computador. Gente, isso naquela época era o melhor prêmio que podia se esperar! Cada escola deveria adotar seu método de escolha, independente de qual fosse.
A solução que minha escola escolheu foi mandar todos os alunos escrever uma redação sobre os 500 anos do Brasil, sem avisar mais nada, fingindo ser uma redação comum. Eu estudava em uma escola estadual muito boa que tinha turmas de primeira a quarta série, quatro turmas pra cada ano com uma média mínima de 30 alunos cada, ou seja, pelo menos 480 alunos estudavam ali. E alguns dias depois dessa nossa atividade eu fui chamada na coordenação da escola. Eu, que era tão comportadinha e não fazia nada de errado!
Quando cheguei lá (tremendo de medo da cabeça aos pés) eles me mostraram minha própria redação e falaram que tinham me escolhido para o concurso em questão. Pediram que eu falasse com meus pais para eles me darem autorização e me mandaram pra casa com um bilhete explicando tudo. Lembro que saí perguntando pra escola inteira quem mais iria, quem foram os escolhidos das outras turmas, mas não tinha nenhum. Era só uma, em mais de 400, e essa “uma” era eu.
Não, eu não ganhei o concurso. O primeiro lugar foi um ex-colega meu de pré-escola que estudava agora em outro lugar (e merecido, porque aquele era, sem dúvidas, o melhor colégio da cidade na época). Saiu no jornal e tudo mais: uma foto dele com a família falando que era o vencedor. Eu fiquei feliz em saber que ele tinha ganhado, mas minha mãe não sossegou enquanto não ligou para qualquer que fosse o “órgão” responsável por aquele concurso para descobrir se eu tinha alguma colocação. E tinha: segundo lugar. Não recebi nenhum prêmio, mas ganhei meu dia!
Dizem que para escrever bem você precisa ler bastante. Eu só acredito nisso em partes. Lógico que você reproduz aquilo que sabe, o que te leva a escrever aquilo que lê (o que é assunto pra outro post). Mas existem tantos exemplos que fogem a essa regra que chego a pensar que esse tipo de coisa não tem muita explicação. Eu conheço gente que lê muito, o tempo inteiro, e escreve muito mal, em todos os aspectos. Meu caso era o contrário: só fui gostar de ler um ano depois desse concurso, quando a obra de J.K. Rowling veio parar em minhas mãos. Ainda assim não sei explicar como ou por que, mas juntar palavras em um texto sempre foi meu ponto forte. E eu só fiquei sabendo disso naquele dia quando minha mãe me deu essas duas notícias: a primeira de que eu tinha ficado em segundo lugar; a segunda, e talvez a mais importante até hoje na minha vida, que eu estava de parabéns e que escrevia muito bem!
Foto tirada no final de 1996, nos meus últimos dias da pré-escola: minha mãe me ajudando num dever de casa e eu lá, de lápis na mão, escrevendo. Eu tirei uma “foto da foto”, por isso minha cabeça está deformadinha, mas essa é a que melhor pode representar!
Suzi
Na verdade, tem várias questões que pesam para uma pessoa escrever bem. Ler muito ajuda porque amplia o vocabulário. Mas, assim como falou, não é o bastante. Conheci um rapaz que tinha boas ideias. Mas quando as colocava na tela, eu tinha que revisar todo o texto (ele foi um dos colaboradores do meu blog, numa época atrás). Sabe a falta de pontuação? Ausência de vírgulas e paralelismo inexistente? Era muita coisa errada, eu sofria pra reescrever aqueles textos. Porém, tinha que fazê-los para o bem dos meus leitores. Agora um fato: ele lia muita coisa. Por que isso não influiu na sua escrita, não faço a mínima ideia.
Vih B
Que bacana sua história, eu estou sempre tentado escrever melhor (preciso, por causa da faculdade de direito) e acho que muitas vezes a internet acaba atrapalhando, mas seu post me inspirou, haha, vou até tentar começar escrever mais certinho na internet 🙂
Também acredito em partes nessa questão da leitura para escrever bem, no meu caso ajuda bastante, mas como você disse depende de caso para caso 🙂
Ah, Luly, você tem fã-page? Procurei e não achei!
beijos
Catarina
Oi Luly! Que legal saber da sua história, eu adorei.
Eu, quando era pequena, tinha a letra garranchada pra caramba. Minha mãe me obrigava a refazer tudo quando via que minha letra tava feinha kkk sem contar dos cadernos de caligrafia. Hoje em dia minha letra até que é legal, mas não sou muito boa com textos, sabe? Meu problema é o “start”, aquele iniciozinho chato! Depois que eu tenho uma boa ideia e começo, o resto flui. ueoaueoa um dia quem sabe eu não pego o jeito da coisa como você. haha
Beijos
Daninha
Isso de “ler bastante para escrever bem” é muito relativo. Eu realmente não herdei o dom da escrita da família (acho que você pegou todo para você), mas não fico um só dia sem um livro na mão.
Sinceramente, isso sempre foi algo de que senti muita raiva. Eu era boa em tudo “Lulu é esforçada, Dani inteligente”. Raios! Você escrevia bem e era esforçada, assim era boa em tudo. Eu? Blá! Inteligente, não escritora.
Bom, aqui está sua maior fã. Eu conheço todas suas histórias – pelo menos acho que sim – e gosto de todas. Espero terminar de ler uma certa por aí…
Daninha
P.s.: I love you!
Lili
Adorei o post…
Aquelas na a vê… Depois faz um post sobre A Princesinha? rs…
:*
Luly
Faço!
Maeve
Que história inspiradora! É muito bom receber um elogio desses, né? Especialmente da nossa mãe. E ficar em segundo lugar nesse concurso, que demais! Achei sua escrita muito fluida e agradável mesmo, parabéns!